José Luis Fortunato
Unsplash / Jorge-sa-pinheiro
25 de Novembro de 2021
1. Poderia falar-nos do seu trabalho como jornalista?
Comecei a publicar crónicas num jornal criado no liceu Salvador Correia, em 1973, em Luanda. Mais tarde, fui colaborador do Jornal de Angola, publicando artigos e caricaturas, pois também sou desenhador amador. Nos anos 80, entrei para os quadros do Jornal de Angola, como chefe da Área Editorial e da Cultura. No final da década de 80, fui trabalhar para o UNICEF Angola, como Assistente de Informação. Em 2008, entrei para a diplomacia e fui a Paris, trabalhar na Representação de Angola junto da UNESCO, como Adido de Imprensa, cargo que deixei em 2021, para dirigir o jornal CULTURA, em Luanda. Estou aposentado, mas prossigo com um programa de língua
portuguesa na TPA e entrevistas em diversos órgãos. Este ano, recebi o Prémio SADC de Jornalismo, na categoria de Imprensa. Já em 2005, tinha sido galardoado com o Prémio "CNN- Multichoice de Jornalismo", na mesma
categoria.
Os média podem e devem propagar a paz, dando margem a que todos se pronunciam.
2. Considera que a imprensa e os mídias têm uma responsabilidade na promoção da cultura de paz?
A maior das responsabilidades. O conflito no Ruanda começou com um programa na rádio, que alimentava o ódio entre hutus e tutsis. Os média podem e devem propagar a paz, dando margem a que todos se pronunciam, sem exclusão de partes e que estas partes se digladiem, com urbanismo, respeito e civilidade.
3. Angola venceu o 1º lugar no Prémio de Jornalismo SADC de 2021, na categoria de imprensa, com um artigo de sua autoria intitulado "A síndrome do isolamento cultural entre as nações da África Austral". O que significa para si esta vitória?
Geralmente em África, mais do que noutras latitudes, o que domina é o discurso e a vontade dos políticos. Os intelectuais têm pouca voz e participação decisiva nas grandes áreas do desenvolvimento regional ou pan-africano, porque não são ouvidos, não são convidados para as cimeiras da União Africana ou outros fóruns. Quando se ganha um prémio regional, em qualquer área, o público desperta para conhecer a obra do vencedor. Se o meu artigo sobre a invisibilidade cultural dos nossos países na África Austral for lido pelos nossos dirigentes na SADC esse seria o meu maior prémio. Porque levanto uma questão muito actual e pertinente. Nós, africanos, não podemos continuar de costas viradas uns para com os outros.
4. Além de ser jornalista, professor, escritor, também é poeta e ganhou o Prémio de Poesia Sagrada Esperança em 1981, e o Grande Prémio Sonangol de Literatura em 1989. Pensa que os artistas têm também
um papel a desempenhar na cultura da paz?
Um papel relevante. O nosso mundo é um lugar muito perigoso para viver. Construir os fundamentos da paz é um dever de cada artista. A Minha maior preocupação tem sido com a educação das crianças e dos jovens. Por isso,
sou professor e tenho desenvolvido projectos ligados à escola primária e à educação em geral nas comunidades. Nós, os artistas, devemos dedicar mais tempo a interagir com as crianças, e a forjar atividades lúdicas que
lhes ensinem o respeito pelo outro, o respeito pela diferença e pelo meio ambiente.
5. Que conselhos daria a jovens africanos que gostariam de participar no jornalismo?
O jornalismo é uma das profissões mais perigosas do planeta. Mesmo assim, atrai muitos jovens, devido ao desafio que é comunicar. Esta é uma tendência inata do ser humana, desde os tempos das cavernas. Os jovens aspirantes à carreira de jornalista devem, primeiro, dominar a língua de trabalho. Em segundo lugar, devem ter uma Cultura Geral sólida. Um dos elementos dessa Cultura Geral é o conhecimento da História Geral de África, da História dos seus países, um pouco de filosofia, geografia e ciência. Em suma, o aspirante a jornalista deve ser uma pessoa ávida de conhecimento, para publicar peças jornalísticas de qualidade universal. Para isso, deve ler muito, desde romances, contos, jornais, revistas, ver filmes educativos e participar em debates sobre diversos temas. E, sobretudo, ser um humanista, dominando a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Declaração dos Direitos do Homem, a Carta Africana do Renascimento Cultural e outros normativos universais.